domingo, 25 de agosto de 2019

A Estrada Nacional 2


A Estrada Nacional 2 

 


Introdução

 

(...) A Estrada Nacional 2 (N2) foi projetada como ligação entre Chaves e Faro num percurso que segue a espinha dorsal do país, sendo a estrada nacional mais extensa de Portugal e a única que o atravessa de lés a lés. Atravessa 36 municípios, passa pelo interior das povoações e liga paisagens tão diferentes como as vinhas durienses, as planícies alentejanas ou as praias algarvias. A N2 é a terceira estrada mais extensa do mundo, a seguir à rota 66 dos Estados Unidos da América (EUA) e à rota 40 da Argentina.

A N2 é uma manta de retalhos, com uma variedade de relevos e paisagens, gentes e culturas, incomparável com qualquer outra Estrada de Portugal. Cruza alguns dos mais importantes rios de Portugal e Ibéricos, nomeadamente Mondego, Zêzere, Tejo, Douro, Paiva, Corgo, Dão, Tâmega, Ceira. Várias serras também fazem parte deste itinerário: Caldeirão (Algarve), Lousã (Coimbra), Montemuro (Viseu) e Marão (Vila Real). Ao longo deste "meridiano" intra-português também transpomos algumas barragens:  Montargil (Sôr), Cabril (Zêzere) e  Aguieira (Mondego). (...)







 Etapas
Decidi fazer a N2 em autonomia total e sem apoio, por isso e para facilitar a logística dos transportes dividi este desafio em 2 grandes etapas.

A primeira etapa foi realizada em 5 dias no sentido Sul-Norte, entre Abrantes e Chaves e totalizou 404 kms. 

1º dia - Abrantes – Pedrógão Grande ----- 78km

2º dia - Pedrógão Grande – Penacova ---- 82km

3º dia - Penacova – Viseu  ------------------- 79km 

4º dia - Viseu – Vila Real ---------------------  99km

5º dia - Vila Real – Chaves  ------------------- 66km



A viagem de regresso foi totalmente realizada de bicicleta, primeiro pela ecopista da linha do Corgo (96km), depois à beira do rio Douro até ao Porto (135km) e os restantes 270kms, entre o Porto e Caldas da Rainha, foram ao longo da costa.

No total foram 11 dias e 905km.



A 2ª parte da N2, prevista para o Outono, também terá início em Abrantes e seguirá a direção Norte-Sul, de modo a percorrer os restantes 333km até Faro, no marco que assinala o km 737.

 

11 Agosto (dom)  - Viagem até Abrantes

 

Depois de uma boleia até Santarém, viajei no comboio intercidades das 20h04 até Abrantes, com bilhete de bicicleta (este comboio dispõe de 2 lugares para ciclistas).

Chegado à estação de Abrantes, atravessei a ponte do rio Tejo e subi até à Pousada de Juventude onde pernoitei, depois de jantar uma feijoada de choco junto ao rio Tejo e à beira da N2.

Na minha camarata estava outro ciclista de nacionalidade estrangeira, mas nem conversámos um com o outro, pois quando cheguei ele já estava na cama e no dia seguinte saiu mais cedo.

 

12 agosto (seg)

1ª etapa -  Abrantes – Pedrógão Grande --- 77km

 

Acordei por volta das 7h00, organizei os alforges e tomei o pequeno-almoço na pousada (incluído no preço – 12,5€) e comecei a pedalar pouco depois das 8h30.

Nos primeiros quilómetros usei o GPS para mais facilmente encontrar a N2.

O primeiro marco quilométrico que encontrei, foi à saída da ponte sobre o Tejo em Abrantes e indicava 404km até Chaves.



Atravessei Alferrarede e 10km depois fiz um ligeiro desvio para passar por dentro da vila de Sardoal.

Em Vila de Rei, onde passei às 11h00, parei para beber uma coca-cola e comer um pastel de nata.

Continuei e mais à frente fiz um pequeno desvio e uma íngreme subida para visitar o centro geodésico de Portugal de onde a vista de 360º é magnífica.



Estava a 18 km da Sertã e foi lá que almocei. Não conhecia esta vila e fiquei impressionado com a beleza da  zona ribeirinha  e também com a enorme vitalidade industrial desta região.



Depois do almoço continuei até Pedrógão Pequeno por um bonita e tranquila estrada com muitas sombras de floresta mediterrânica. Desci em direção à barragem do Cabril, onde fiz uma paragem de 2 horas para descansar e tomar banho nas transparentes águas da albufeira.






Como já passava das 18h00 e já tinha pedalado 77km, decidi ficar no parque de campismo do Cabril. Montei a tenda num local com uma espetacular vista para a barragem, tomei um duche e fui ao supermercado de Pedrógão Grande comprar comida para o jantar e para o pequeno-almoço do dia seguinte.



13 agosto (ter)

2ª etapa – Pedrógão Grande – Penacova ---- 81km

 

Saí do parque de campismo eram 8h40 e atravessei a vila de Pedrógão Grande.

Liguei o GPS, uma vez que tive dúvidas se estaria na estrada certa, pois a N2 não está muito bem sinalizada.






Os primeiros quilómetros foram tranquilos em planalto, para depois descer até à povoação de Alvares (alt. 320m), onde iniciei a subida da serra da Lousã, mais de 10km até ao alto de Cabeçadas (alt. 775m), onde virei à esquerda.



 Antes de iniciar a descida, parei para comer e descansar junto ao antigo café “Toca do Judeu”, onde estive à conversa com o proprietário, um simpático e cheio de vitalidade senhor de 89 anos.

E a partir daqui foi uma espetacular descida de 10km até Góis (alt. 180m) a uma média de 40km/h, num serpenteado de curvas com bom piso e com ótima inclinação, o que permitiu usufruir bastante da descida.

Em Góis, comprei comida num minimercado e fui  para o relvado da praia fluvial  do Penedo dar uns mergulhos, almoçar e descansar naquelas belas sombras.



Era véspera do Encontro de Motos de Góis e já se viam motards por todo o lado.

Voltei à estrada já passava das 14h30. Os primeiros quilómetros foram pelo vale do rio Ceira, mas depois vieram as subidas, antes de voltar a descer para Vila Nova de Poiares, onde fiz nova paragem para descansar e beber uma coca-cola.

Continuei mais uns quilómetros até encontrar as margens do rio Mondego, que me acompanhou até ao Parque de Campismo Municipal em Vila Nova (Penacova), localizado entre o rio Mondego e a N2, onde cheguei cerca das 16h30. Montei a tenda, dei um mergulho no Mondego e fui comprar comida para o jantar.









 

14 agosto (qua)

3º dia – Penacova – Viseu  --79km

 

A manhã acordou fria e com nevoeiro no vale do Mondego. Depois de arrumar  e comer, comecei a pedalar eram 8h15. Os primeiros quilómetros, pela antiga N2 foram tranquilos até à povoação de Oliveira do Mondego, onde a N2 foi engolida pelo IP3, estrada por onde tive que circular alguns quilómetros até passar a ponte da barragem da Aguieira.

Mais à frente, os ciclistas estão impedidos de continuar no IP3, pelo que pedalei alguns quilómetros por uma estrada de serviço, sempre próximo do rio Mondego. Foi já perto de Santa Comba Dão que voltei à antiga N2, por onde continuei até à aldeia de Vimioso (Santa Comba Dão) onde visitei a casa onde nasceu o ditador António Oliveira Salazar, assim como o cemitério onde está sepultado em campa rasa, conforme foi seu desejo.







Aqui tomei a opção de, em vez de continuar até Viseu pela N2, seguir pela ecopista da linha do Dão, na procura de mais tranquilidade e segurança. Esta ecopista com 49km de extensão, foi construída numa parceria entre os 3 municípios por onde passava a antiga linha, e cada um pintou o piso do respetivo troço de cor diferente, de azul no concelho de Santa Comba Dão, de verde em Tondela e  de laranja em Viseu.


Entrei na ecopista poucos metros à frente da estação de comboios de Santa Comba Dão (linha da Beira Alta) e gostei muito da primeira parte, que segue até Tondela, ao lado do rio Dão.



Em Tondela fiz um desvio até à entrada da cidade, onde almocei uma francesinha. Antes de voltar à ecopista, e porque estava muito calor, decidi dormir uma sesta numa sombra na antiga estação de Tondela. Fiz uma paragem para beber uma coca-cola, comer um pastel de nata e encher o cantil na antiga estação de Figueiró, que foi requalificada com muito bom gosto como snack bar.





Cheguei a Viseu, pouco depois das 16h30 e fui direto à Decathlon comprar um colchão de encher, pois o colchonete que levava não era lá muito "ortopédico". Este desvio traduziu-se em mais 12kms.

Depois de passar pelo centro histórico de Viseu dirigi-me à mata do Fontelo, à procura do parque de campismo, mas fui informado que estava fechado e que agora apenas tem as valências de acampamento de escuteiros e albergue de peregrinos. Resolvi tentar a minha sorte e consegui ficar no albergue de peregrinos, um acolhedor edifício de madeira com 16 beliches (3€), onde naquela noite não pernoitou mais ninguém.




Depois de um banho, fui jantar à Feira de S. Mateus e ainda assisti ao concerto do cantor Fernando Daniel.



15 agosto (qui)

4º dia – Viseu – Vila Real ----  99km

 

Saí do albergue pelas 8h30 e desci até ao local da Feira de S. Mateus para apanhar a N2.  Os primeiros quilómetros até às termas do Carvalhal foram tranquilos, mas depois de uma descida até ao vale profundo do rio Paiva (alt. 440m), em que fui "escoltado" por um enorme grupo de “motard’s”, foi preciso subir bastante até ao centro de Castro Daire, onde parei para encher o cantil numa fonte e lanchar. A subida continuou durante mais 20km até ao alto de Bigorne (alt. 970m), o ponto mais alto de toda a N2.  E finalmente chegou a descida. 10km até Lamego e mais 13km até à Régua. Em Lamego fiz uma paragem para almoçar numa esplanada da avenida, em frente do santuário de Nossa Senhora dos Remédios.


Voltei à estrada e continuei a descer envolvido pela grandiosa paisagem do Douro, pintada de vinhas em socalcos. Atravessei o Douro pela ponte pedonal da Régua (alt. 60m), onde cheguei em dia de feira e com muito calor. Descansei um pouco e bebi uma coca-cola antes de ganhar coragem para os últimos 23km do dia.


A paisagem continuava deslumbrante, mas foi quase sempre a subir até Vila Real, debaixo de muito calor e ausência de sombras. Uns quilómetros antes de iniciar a descida até à ponte do rio Corgo à entrada de Vila Real pela N2, parei para beber mais um refresco. Atravessei a zona antiga da capital de Trás os Montes e continuei até ao parque de campismo. Montei a tenda, tomei um banho e fui jantar uns secretos de porco preto numa ruela na zona antiga. E fui dormir, pois tinha sido uma etapa dura… pelo calor, pelos quilómetros, pela altimetria e pelo peso da bicicleta (22kg) que não me “deixava” subir a mais de 8-10km/h.

 

16 agosto (sex)

5º dia  Vila Real – Chaves ----- (66km)

 

Estava a 66km de Chaves. Saí de Vila Real às 8h30 e os primeiros 11km foram a subir, até chegar ao planalto por onde pedalei os restantes até Vila Pouca Aguiar (alt. 730m), onde cheguei por volta das 12h00. Dei uma volta pela vila, almocei e continuei. Faltavam 31km para Chaves.

Depois foram 10km a descer até Pedras Salgadas e outros tantos até Vidago, onde visitei o majestoso Hotel Vidago Palace, inaugurado em 1910 pelo rei D. Manuel II.



Até chegar a Chaves, foi mais um sobe e desce, debaixo de muito calor.

 



Chaves fica num vale junto ao Rio Tâmega e desde tempos remotos foi povoada por Visigodos, Mouros e Romanos. A ponte romana com 12 arcos e 150m é uma fantástica obra de engenharia.

Fui ao marco do quilómetro zero tirar a foto da chegada, passei pela fonte termal onde bebi um copo de água das nascentes termais, que são as mais quentes da Europa (cerca de 73ºC) e fui almoçar ...e descansei um pouco antes de iniciar a viagem de regresso.


Balanço Final

 

Foram 5 dias intensos, em que passei por locais fantásticos.

A N2 permite-nos viajar por um Portugal autêntico, rico em história e cultura e sempre rodeado de paisagens maravilhosas.

É um grande desafio para qualquer ciclista. Mas viajar em autonomia e a acampar, com uma bicicleta a pesar 22kg, transportando todo o equipamento básico para sermos auto-suficientes, obriga a fazer as subidas muito devagar, muitas vezes a 8km/h e isso não permite fazer muitos quilómetros por dia.

Há quem faça a N2 como se de uma competição se tratasse, mais focados em estatísticas cronométricas, do que em apreciar e usufruir de tantos locais cheios de beleza e história. Já houve quem fizesse os 737km da N2 em apenas 29h. Outros fazem-no em 3, 4 ou 5 dias.

Eu não faço parte desse tipo de ”viajantes”. A N2 merece ser vivida e saboreada com mais tempo. Por isso afirmo que viajar devagar é fantástico, pois dá-nos mais tempo para apreciar a identidade das povoações e usufruir dos cheiros e das cores das paisagens.

E viajar sozinho é bom porque somos verdadeiramente o comandante de nós próprios. Temos todo o tempo para meditar ou refletir, somos nós quem escolhe o ritmo, as etapas, as paragens, as comidas e os locais para descansar ou pernoitar.


O regresso a casa


1– Pela Ecopista do Corgo (96km)


Depois de ter chegado ao marco que indica o Km 0 da N2 e assim ter completado a 1ª parte da travessia da mais extensa estrada nacional, regressei ao Peso da Régua pela Ecopista do Corgo, que com uma extensão de 96 km, foi o resultado da requalificação da desativada linha de caminho de ferro do Corgo (originalmente denominada Linha do Valle do Corgo ou Caminho de Ferro da Regoa a Chaves), que unia as localidades de Peso da Régua e Chaves, passando por Vila Real, Vila Pouca de Aguiar, Pedras Salgadas e Vidago.






Esta linha foi inaugurada em 1910 e concluída em 1921 com a chegada a Chaves. As primeiras locomotivas a vapor mantiveram-se até 1978, altura em que foram substituídas pelas diesel. O troço entre Vila Real e Chaves foi encerrado em 1990, enquanto a ligação entre a Régua e Vila Real foi desativada para obras em 2009, sendo totalmente encerrada pela Rede Ferroviária Nacional em Julho de 2010.


Esta ecopista está ciclável em praticamente toda a sua extensão, mas só no concelho de Vila Pouco de Aguiar é que o pavimento é betuminoso.





2 - Pelas margens do Douro (135km)
A partir de Peso da Régua, continuei até ao Porto, ao longo das margens do rio Douro, a maior parte do tempo pela N108. Durante os primeiros quilómetros pedalei à beira do rio, mas depois fui subindo até altitudes acima dos 600m, de onde pude desfrutar de fantásticas vistas sobre o rio Douro.


É muito bonita a foz do rio Paiva. Em Entre os Rios, local onde o Rio Tâmega se junta ao rio Douro, visitei o memorial às vítimas da queda da ponte.



A aproximação ao Porto, pelo passadiço que se estende por muitos quilómetros até ao Freixo, é espetacular, mas a chegada ao centro foi um choque, tal era a multidão de turistas que se acotevelava na baixa de Vila Nova de Gaia, na Ribeira do Porto e em cima do tabuleiro da Ponte D. Luís.

 3 – Ao longo da costa (270km)
Depois de ter pernoitado no Albergue da Juventude do Porto, retomei a viagem de regresso a casa, desta vez ao longo da costa, pedalando e dando uns mergulhos. Despedi-me do Douro e continuei pelas praias da Afurada, Madalena, Espinho, Esmoriz, Furadouro.
No dia seguinte a ria de Aveiro foi minha companhia durante mais de 40 quilómetros, (Vagos, Torreira, S. Jacinto, Costa Nova, Vagueira, Mira e Tocha).
Na penúltima etapa passei por Quiaios, Buarcos Figueira da Foz, Leirosa, Lagoa da Ervideira, Pedrógão e Praia da Vieira.
E no último dia passei por S. Pedro de Moel, Paredes, Nazaré, S. Martinho do Porto e Caldas da Rainha.







 

5 comentários:

Unknown disse...

Caro Vítor Milheiro
Notável: a cada realização, a minha admiração por ti é maior.
Abraço amigo
Alfredo Silva

Vitor Milheiro disse...

Cada um de nós arranja desafios para se manter vivo.
Eu sinto-me motivado para ir descobrindo novos territórios...sempre que possível de bicicleta.
E já há mais uns quantos na calha!!!
abraço

Luis Eme disse...

Grande aventura!

Estás quase pronto para uma "Volta ao Mundo". :)

abraço

Vitor Milheiro disse...

para já estamos empenhados em dar a volta a Portugal, ficar a conhecer melhor os encantos e recantos do nosso país.
Vítor

Rita Brás disse...

Muito bom!!
Um dia também pretendo fazer a N2 de bicicleta.
Muito obrigado pela partilha!! as palavras levam-nos a viajar mesmo sem sair do lugar, é um privilégio

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